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Deu “match”? Biomédicos avaliam compatibilidade de órgãos para transplantes

06-09-19 | Destaque, Notícias

A equipe do Laboratório de Imunologia de Transplantes (LITx) da Santa Casa de Porto Alegre, já sabe: o chamado pode vir a qualquer momento. Afinal, o Laboratório é responsável por avaliar a compatibilidade entre doadores e receptores de órgãos, um procedimento fundamental para assegurar o bom resultado de um transplante – e que não escolhe hora para acontecer.

A grande maioria das doações de órgãos do sul do país ocorre com doadores falecidos em morte encefálica, o que exige agilidade e prontidão dos profissionais envolvidos durante todo o processo de um transplante, que se inicia com trabalho das assistentes sociais na entrevista com os familiares do doador falecido, passa pelos médicos na mesa de operação e termina no acompanhamento do paciente no pós-transplante. No meio deste percurso, o Laboratório encarrega-se de atestar se as características imunogenéticas do receptor combinam com a do órgão doado – ou, para usar uma linguagem contemporânea, se deu “match” entre um e outro.

É nesta etapa que entram em ação biomédicos como Tiago Schiavo, conselheiro do CRBM-5. Habilitado em patologia clínica, mestre em patologia geral e experimental, Schiavo é um dos 14 analistas laboratoriais integrantes da equipe do LITx. Além dele, outros quatro biomédicos trabalham no local que é referência mundial pelos protocolos de compatibilidade que utiliza.

O conselheiro do CRBM-5 nos conta com mais detalhes sobre os procedimentos que ajudam a promover o melhor encontro entre o órgão doado e o receptor.

Qual a importância do trabalho feito no laboratório de imunologia para determinar o sucesso de um transplante?

Tiago Schiavo – Total. Não existe transplante sem o suporte do laboratório de imunogenética. A avaliação do risco imunológico é determinante para evitar ao máximo o risco de rejeição hiperaguda, aguda e crônica. Nosso trabalho é vital para o sucesso de um transplante.

“Nosso trabalho é vital para o sucesso de um transplante”. Tiago Schiavo, conselheiro do CRBM-5.

Quando se fala em transplante de órgãos e tecidos, histocompatibilidade e imunogenética são dois termos comuns. O que eles significam e o que representam neste processo?

TS – São palavras complementares. A histocompatibilidade é a compatibilidade ou a equivalência entre células, tecidos e órgãos. A compreensão dos aspectos genéticos dos antígenos, assim como da formação e ação dos anticorpos é realizada através de técnicas imunológicas e genéticas, denominando, assim, a área de atuação como imunogenética.

A principal finalidade da imunogenética nos transplantes é encontrar a melhor compatibilidade entre doador e receptor possível. Isso causará impacto direto na sobrevida desse órgão e, por consequência, na qualidade de vida do paciente no pós-transplante.

Cada tipo de transplante exige pré-requisitos de compatibilidade diferentes?

TS- Sim, em órgãos sólidos pode-se ser mais flexível quanto à compatibilidade, o que não é possível nos transplantes de medula óssea, nos quais se busca idealmente uma compatibilidade idêntica.

Quais são as etapas para se verificar a histocompatibilidade entre doador e receptor?

TS- No que diz respeito à avaliação imunológica, existem, basicamente, três processos nos transplantes de órgãos sólidos. A primeira etapa é a tipagem do HLA (Antígeno Leucocitário Humano). O HLA é fundamental na determinação da identidade biológica de cada indivíduo e tem papel importante no sistema imunológico, pois identifica e impede que um corpo estranho entre e/ou se espalhe no organismo. No contexto dos transplantes, sabendo esta “identidade genética” do doador é possível buscar a maior semelhança genética com o possível receptor. Quanto maior a semelhança, melhor será o prognóstico do paciente.

Além da tipagem, realizamos uma análise entre anticorpos pré-formados do receptor, detectados por um teste de fase sólida, contra antígenos do HLA do doador. Chamamos de prova cruzada virtual. Com isso, estabelecemos critérios para estimar se o transplante é de alto ou baixo risco imunológico, antes mesmo da realização da prova cruzada física. Inclusive, desenvolvemos um software para organizar e agilizar a análise de todos estes critérios. Chamamos de Protocolo Informatizado de Análise de Anticorpos (PIAA).

Por fim, realizamos a prova cruzada física, que consiste em empregar linfócitos do doador contra o soro do receptor a fim de detectar anticorpos contra antígenos desse doador. Serve como uma “simulação” do transplante in vitro para avaliarmos o risco de rejeição. É o teste padrão ouro.

Quais são as diferenças do processo de avaliação da compatibilidade para o transplante de um doador falecido e de um vivo?

TS- O fator tempo é uma diferença relevante. No caso de um doador vivo é possível fazer todos os exames de forma agendada, com tempo. Com o doador falecido, todo o processo de doação deve ocorrer do início ao fim, o mais rápido e possível, visto que estamos correndo contra o tempo de isquemia do órgão doado. Em um transplante renal, por exemplo, trabalhamos com um prazo de 24 horas, idealmente.

O que diferencia o protocolo do Laboratório de Imunologia da Santa Casa ? O que faz dele referência?

TS- Nós utilizamos o protocolo Halifax por citometria de fluxo, desenvolvido pelo Dr. Robert Liwski que, comparado às demais técnicas, é a mais rápida e sensível que existe no mundo. Em parceria com Dr. Liwski, o Dr. Jorge Neumann, diretor do laboratório, padronizou e trouxe para o Brasil, nos tornando os pioneiros no uso desta técnica. Inclusive, desenvolvemos cursos para auxiliar os demais laboratórios que têm interesse em aprender este método. Isso ajudou a melhorar a qualidade dos testes no Brasil. Além disto recentemente incorporamos o sequenciamento de DNA por NGS (Next Generation Sequencing), técnica extremamente precisa para a definição dos alelos HLA.

O estudante de Biomedicina que quiser trabalhar nesta área, qual caminho deve seguir?

TS- A imunogenética ainda não é uma habilitação da Biomedicina. Mesmo assim, biomédicos com habilitação em patologia clínica podem atuar em todos os setores. Também se pode atuar com habilitações para setores específicos, como imunologia e/ou biologia molecular, por exemplo.

É um nicho pequeno: existem em torno de 50 laboratórios no Brasil. Pode-se tanto trabalhar na área privada como realizar seleção por concurso, dependendo da instituição.

A dica para o estudante que se identifica com a área é: ter muita dedicação, buscar estágios e especializações na área e acima de tudo, gostar muito de imunologia. Não existe sucesso se você não ama o que faz.

Estamos no mês de incentivo à doação de órgãos. Queres deixar algum recado sobre isso?

TS- Sim, aproveito a oportunidade para lembrar sobre importância de ser um doador de órgãos. Deixe claro para sua família sua vontade, pois somente ela pode tomar essa decisão. Visite nossa página https://1salva8.santacasa.org.br/.

Site da Santa Casa traz informações sobre a doação de órgãos. O complexo hospitalar foi responsável por 627 transplantes em 2018.

Imprensa CRBM-5

 

 

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