A biomédica Juliana Nichterwitz Scherer, doutora em Psiquiatria e Ciências do Comportamento, coordenadora do curso de Biomedicina e docente na Universidade do Vale do Rio dos Sinos (Unisinos), está à frente de um projeto que pretende entender como os brasileiros buscam, interpretam e utilizam informações sobre saúde no cotidiano — e como isso influencia suas decisões. Intitulado Desmistifake, o estudo tem apoio do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e do Ministério da Saúde.
Segundo a coordenadora, a motivação para o projeto surgiu da observação de um fenômeno preocupante durante a pandemia de COVID-19: a rápida disseminação de desinformação, que comprometeu a adesão a medidas preventivas, tratamentos e vacinas. A experiência anterior de Juliana em um estudo sobre hesitação vacinal revelou que o problema ia além das fake news. “Muitas pessoas tinham dúvidas genuínas sobre temas básicos de saúde, como por exemplo como é produzida uma vacina. Também percebemos que muita gente tem dificuldade em diferenciar fontes confiáveis e interpretar evidências científicas”, explica.
Foi nesse contexto que ela convidou a Profa. Mellanie Dutra, também biomédica e colega na coordenação do curso de Biomedicina da Unisinos, e o Prof. Adalvane Nobres, do curso de Enfermagem, para criar um projeto interdisciplinar voltado à promoção do pensamento crítico e da autonomia cidadã na área da saúde.
De acordo com Juliana, praticamente todos os assuntos relacionados à saúde estão sujeitos à desinformação — desde os mais antigos, como vacinação infantil, até os mais recentes, como saúde mental. A pesquisa busca mapear esses focos de confusão com base no que dizem os próprios participantes.
“Vacinas, uso de medicamentos sem prescrição, curas ‘naturais’ ou milagrosas, emagrecimento rápido, suplementos e terapias sem validação científica são temas que aparecem com frequência”, destaca. Esses conteúdos costumam ser apresentados com linguagem técnica, apelo emocional e até por profissionais da área da saúde, o que reforça sua credibilidade aos olhos do público.
A combinação entre excesso de termos científicos, promessas exageradas e circulação por canais fechados, como grupos de WhatsApp, contribui para esse cenário. Quando as pessoas não têm uma base sólida de conhecimento em saúde — o que os pesquisadores chamam de literacia em saúde — acabam se tornando alvos fáceis da desinformação.
Uma das etapas mais importantes do projeto é entender como diferentes perfis de pessoas se relacionam com a informação em saúde. Para a equipe do Desmistifake, é essencial que as estratégias de comunicação levem em conta as realidades diversas da população brasileira. “O que funciona para um jovem ativo nas redes sociais pode não fazer sentido para um idoso da periferia que não usa internet ou tem baixa escolaridade”, afirma Juliana.
Mesmo antes de finalizar a análise dos dados, a equipe já tem aplicado esse princípio na produção de cartilhas, postagens e oficinas. Os materiais estão sendo desenvolvidos com linguagem acessível, visual atrativa e exemplos do cotidiano, com circulação tanto no ambiente digital quanto em espaços físicos como escolas, unidades de saúde e eventos comunitários.
Juliana destaca que o projeto tem dois grandes objetivos. O primeiro é compreender quais temas de saúde geram mais dúvidas, confusão ou desinformação. O segundo é transformar esse conhecimento em ações educativas concretas. “Queremos que as pessoas saibam onde buscar informações confiáveis, como questionar o que recebem pelas redes sociais e como tomar decisões mais seguras.”
A longo prazo, o impacto desejado é fortalecer o pensamento crítico, promover autonomia nas escolhas em saúde e criar uma cultura mais resiliente à desinformação. “A gente acredita que informação de qualidade, quando bem comunicada, salva vidas — e é isso que nos move.”
A pesquisa está em fase de coleta de dados, e qualquer pessoa maior de 18 anos, residente no Brasil, pode contribuir. A participação é voluntária, anônima e leva apenas alguns minutos. O questionário está disponível em:
📋 https://forms.office.com/r/upWGfmgRjB
Além disso, a equipe do Desmistifake convida a sociedade a se engajar de outras formas: seguindo o projeto nas redes sociais, divulgando os materiais produzidos, sugerindo temas, participando das oficinas e levando suas experiências para o debate.
“A gente acredita que combater a desinformação é um esforço coletivo. Precisamos de todo mundo nessa missão”, finaliza Juliana.
📱 Instagram e TikTok: @desmistifakes